Ultimamente andei bastante ocupado e com pouco tempo pra escrever por aqui. Parte disso por conta de ser parte da organização da PyConSe (Python Conference Sweden) e o evento aconteceu logo agora em maio. Então estava bastante ocupado por cuidando de mandar fazer camisetas, adesivos, e fliers, verificar invoices, checar hotel, etc.
Mas o assunto não é a PyConSE, que pretendo descrever num próximo post (estou aguardando a publicação dos vídeos pra fazer isso), e sim um canal que lançamos faz algum tempo, o Unix Load On.
Canal do Unix Load On no Youtube
Temos um grupo no Telegram de pythonzeiros (ou seriamos pythoneiros?) que deixaram o Brasil e moram atualmente na europa. Inicialmente era um grupo de somente expatriados na europa, mas virou algo mais amplo e geral, com todos que estão fora país. Como para nós fica difícil participar de hangouts feitos pelos grupos no Brasil, criamos um nosso. Gravamos quinzenalmente às 10 da noite no horário local (timezone +02:00), o que é atualmente 5 horas da tarde no Brasil (quando Brasil entra em horário de verão e a europa sai, a diferença fica em 3 horas). E falamos por aproximadamente 2 horas, com aqueles 5 minutos técnicos pra "já vai acabar".
Os Hangouts em geral tem pouca participação de pessoas no Brasil pelo horário (é duro competir com happy hour), mas têm bem mais audiência depois. Comentamos sobre assuntos gerais em tecnologia, mas sempre com uma pitada de python e software livre. Vamos de política de privacidade a mercado, variando bastante os assuntos e os escopos cobertos.
Recentemente adicionamos ainda uma forma de receber sugestões de assuntos para serem comentados. Se quiser enviar uma sugestão basta acessar aqui:
Também temos uma landing page no Facebook, mas serve mais pra coletar comentários e facilitar a publicação dos próximos hangouts por lá.
Se é um ativista de software livre do tipo fanático, não se preocupe da página estar no Facebook pois usamos o Hangout pra fazer os programas e depois publicamos no Youtube. Então não é mesmo pra você.
Esses são os episódios já gravados. Se quiser acampanhar ou mesmo participar do próximo, o mesmo será gravado dia 27 de maio.
Episódio alfa
Episódio beta
Episódio RC1
Episódio RC2
O software livre é tido como um movimento social por várias pessoas. Pelo mesmo motivo muitas outras associam software livre com socialismo ou comunismo, o que já foi desmentido pelo próprio criador do termo software livre: Richard Stallman.
Eu mesmo imaginava que a função social do software livre como a imagem acima, que peguei do projeto de uma colega de trabalho, Eduscope[1]. Era algo que tornaria o mundo melhor e menos desigual, lutando contra as grandes corporações que controlavam o mundo. Essa última parte era outra forma de dizer "sou contra a Microsoft e tudo que ela representa".
E se foram mais de 10 anos com software livre. Linux completou 20 anos. Projeto GNU, 30. E o mundo?
O mundo não ficou menos desigual. Pela situação atual da economia americana, eu diria que até ficou muito mais desigual. O Brasil teve uma melhoria de condição de vida das famílias em geral, olhando num panorama dos últimos 10 anos - e descartando um pouco a crise atual, mas não foi causada pelo software livre. Enquanto isso as empresas de software livre como RedHat, Canonical e Google se tornaram uma corporação tão grande e poderosa como a própria Microsoft, com os mesmo tipos de problemas que tentávamos combater antes.
Onde está esse lado social? Cadê???
Pensando sobre isso, comecei a olhar por outro lado: quais são as empresas de sucesso atualmente? A Forbes lista as principais como sendo:
Se filtrarmos por empresas de tecnologia somente, o ranking fica assim:
Ignorando que a Microsoft disse que "ama o Linux", já que a contribuição dela com software livre é pouca e em geral cobre mais a adaptação ao seu ambiente de cloud, o Azure, todas as demais têm algum envolvimento com software livre. Seja como parte de sua estratégia de negócios, seja como seus produtos ou serviços (o que volta à estratégia). Então é possível ver que software livre é um sucesso no mundo dos negócios, mas ainda não tem nenhum lado social. E no fim empresas cresceram e acabaram virando grandes corporações como anteriormente.
Mas eu pessoalmente acho que surgiu um lado social do software livre que é bem diferente desse de melhoria das condições das populações mais pobrel (continua sendo obrigação do governo) e do fim das grandes corporações. Vou usar o mercado em que trabalho como exemplo pra isso, o de telecomunicações.
Se observar o mercado de telecom de 20 anos atrás, no surgimento do Linux, esse era um mercado dominado por grandes empresas e padrões rígidos. Tudo era definido pela ITU-T ou IEEE com custos altíssimos de aquisição de material. Então existiam poucos interessados - a menos que tivessem muito capital pra entrar nesse mercado - e os equipamentos eram muito caros, o que refletia diretamente nos valores cobrados dos usuários, que tinham basicamente um serviço de voz e nada mais.
Pensando em 10 anos atrás, 2006, esse mercado já tinha sofrido algumas baixas com o surgimento do Skype, que iniciou uma migração sem volta pra serviços de VoIP. Skype não foi o único responsável por VoIP, mas arruinou boa parte das operadoras que tinham como seu negócio a venda de chamadas internacionais. Em 2006 voz ainda era o maior gerador de receita das empresas, mas a banda larga já estava gerava uma outra boa parte e mostrava que estava crescendo. Mas os celulares mais modernos, smartphones, ainda não eram uma realidade próxima pra muita gente.
Olhando esse mesmo mercado hoje em dia, o que aconteceu? Grandes fornecedores de equipamentos simplesmente faliram, como foi o caso da Nortel. Outros se juntaram pra poder sobreviver. Mas a quantidade de fornecedores não aumentou, muito pelo contrário, apenas diminuiu. De onde veio a concorrência que destruiu seu mercado? Veio de IT. Com isso o mercado de telecom se transformou em ICT, Information and Communications Technology, ou Tecnologia da informação e da telecomunicação. Regras fixas que levavam anos, talvez décadas , pra serem definidas foram trocadas por métodos ágeis e softwares mais leves. Normas ITU-T foram trocadas por RFCs da IETF. Empresas que não tinham nenhum conhecimento sobre telecom começaram a tentar esse mercado. A Apple, uma inovadora nesse sentido, simplesmente quebrou todos os paradigmas de telefonia com o lançamento do iPhone. Junto veio o Android. E com isso milhões de programadores começaram a lançar seus apps pra esse mundo novo. O mundo abraçou dados e IP, e voz, antes o carro chefe de mercado, virou um acessório de pouco uso.
Onde está o lado social e software livre nisso? Se pensar nesses momentos, de 20 anos atrás, 10 e agora, verá que o custo do uso de telefonia despencou pro usuário, permitindo mais pessoas participarem desse ambiente. Claro que eu não me refiro a isso como o fator social. Eu me refiro ao montante de receita, que diminuiu pra fornecedores e operadoras, mas não pro mercado como um todo. Essa receita foi dividia com novas empresas.
O que pra mim foi o lado totalmente social proporcionado pelo software livre foi o surgimento de startups. O mercado de telefonia foi totalmente canibalizado por empresas como Skype, Whatsapp, Google Hangout, Facebook Messenger, Viber, Actor, Telegram, etc. O software livre permitiu que pequenas empresas - algumas viraram gigantes - o usassem como base do seu modelo de negócios e participassem de um mercado que até então era totalmente negado a elas. Como exemplo, Whatsapp começou como uma pequena empresa com seus servidores baseados em FreeBSD e Erlang, ambos softwares livres. E todas as startups que existem atualmente se baseiam de um jeito ou de outro em software livre. Seja como base do seu negócio ou seja como ambiente de desenvolvimento.
E isso não foi só no mercado de telecom. O mesmo aconteceu com outros mercados, como o Netflix nos faz lembrar.
Então esse é o lado social que o software livre trouxe em todas as áreas. Se há 10 anos atrás todo mundo só pensava que um emprego bom, com salário razoável, era só vivendo dentro de uma grande corporação, o software livre hoje em dia permite que ele trabalhe de casa pra uma startup que combine com seu modo de vida e seu jeito de pensar, ou mesmo em empreender pra ter sua própria startup.
Software livre ensinou a pescar, e, sim, dividiu o bolo. Que venha mais software livre.
[1] Pra quem quiser saber mais sobre esse interessante projeto de educação, o site é Eduscope. Mas basicamente foi um experimento de acesso à informação em locais muito pobres, como Paquistão. Os sistemas rodavam Ubuntu e as pessoas o usam pra auto-aprendizado (continua funcionando). Criado por uma ex-colega de trabalho como projeto científico de aprendizado.